domingo, 12 de setembro de 2010

OPINIÃO SOBRE O DEBATE EM TORNO DO MODELO DE GESTÃO DOS SERVIÇOS DE ÁGUA E ESGOTO SANITÁRIO DO MUNICÍPIO DE ERECHIM

Por Dieter Wartchow, Prof. Adjunto do IPH/UFRGS
A Lei n° 4560, de 29/09/2009, que “Dispõe sobre a prestação de serviços de abastecimento de água e esgotamento sanitário no Município de Erechim”, em muitos artigos assemelha-se ao que propõe a Lei Federal N° 11.445/2007, que institui a Política Nacional de Saneamento Básico no país. Não conseguimos analisar e conhecer a justificativa para a Lei n° 4560/2009. Contudo, por exigência da Lei 11.445, smj., o Município contratou junto à empresa Ampla Consultoria e Planejamento, ligada à Associação Brasileira de Concessionárias Privadas de Água e Esgoto (ABCON) e à transnacional Odebrecht, para realizar um estudo na cidade(Fonte: notícia abaixo), o qual deveria se constituir no Plano Municipal de Saneamento Básico para o município de Erechim. Será que o que começa errado, termina errado? A lei fala que o titular deve fazer o Plano Municipal de Saneamento, o qual deve ser feito de forma integrado e de forma participativa. A contratação parece não ser ilegal, mas peca na falta de transparência e na ausência de levar suas diretrizes ao conhecimento da população. Por exemplo, discutiu-se no seio da população e Erechim se os serviços de saneamento, em especial os serviços de água e esgoto sanitário, deveriam ser públicos ou privados? Os cenários estudados, portanto, sugerem seu direcionamento para justificar uma opção, que talvez seja boa para quem propõe o negócio e para quem aceita o negócio, menos para a população que pagará o negócio. Aliás, quanto o Município gastou na contratação do estudo de viabilidade?
Em muitos municípios, constatamos que estes, em acordo com uma empresa interessada em gerir os serviços de água e esgoto do município, recebem da empresa um Plano de Saneamento para água e esgoto. Nestes casos, os planos de obras propostas nem sempre atendem ao princípio da necessidade, economicidade, da universalidade (o atendimento para áreas rurais, população de baixa renda), ou projetam cenários cuja proposta tecnológica nem sempre é a melhor. Tudo se orienta pelo equilíbrio econômico financeiro, mas esquece-se que, quem pagará a conta, será o cidadão através das tarifas de água e esgotos.
SMJ, pois não há informações disponíveis sobre previsão de investimentos, custos operacionais e receitas, para o debate seria importante referir as projeções de valores para as obras e sua respectiva amortização. Importante frisar que a população tende a não aceitar as tarifas a serem praticadas para os serviços de coleta e tratamento de esgoto, que deverão ser acrescidas às tarifas de água. Por isso, recomenda-se buscar um equilíbrio nas ações e sobre tudo uma integração das áreas de água, esgoto, limpeza urbana e disposição de resíduos sólidos e drenagem pluvial. Não se recomenda tratar estes temas de forma fragmentada, pois uma atividade pode auxiliar a outra. Por exemplo, para complementar os custos do gerenciamento dos resíduos sólidos, cujas receitas através de taxas são tendencialmente menores do que seus custos, poderia-se utilizar parte do superávit da atividade informada no estudo econômico, para garantir de forma eficaz a prestação destes serviços de RS. Se for privado, não haverá a mínima chance para tal, se for público, a possibilidade existe.
Na justificativa da Lei n° 190, de 27 de novembro de 2009 que dispõe sobre a criação da Agência Reguladora dos Serviços Públicos Municipais de Erechim enviada pelo Poder Executivo para a Câmara de Vereadores, consta que:
“Dessa forma, o Município de Erechim organizará e continuará prestando os serviços de sua responsabilidade, em consonância com o sistema nacional de Saneamento Básico e de outras naturezas, atendendo, dentre outros, os princípios da universalidade e regularidade na prestação, modificação das tarifas, eficiência e sustentabilidade econômica e transparência social das ações públicas.
Pelo exposto, contamos com a especial atenção de Vossa Excelência (referindo-se ao Presidente da Câmara de Vereadores – comentário) e Senhores Vereadores, para a análise e deliberação positiva sobre a matéria apresentada no Projeto.”
Nos parece que no encaminhamento do projeto de lei, visando sua aprovação esta afirmativa não deixou claro os propósitos do poder executivo municipal, levando aos nobres edis de forma subliminar a aprovar algo que talvez não quisessem.
Se estas iniciativas estiverem sendo arquitetadas e consoantes à notícia divulgada no endereço, http://www.radioagencianp.com.br/8997-Agua-e-saneamento-de-Erechim-podem-ser-..., no dia 17/08/2010, a população de Erechim pode pagar por esta iniciativa do Poder Executivo com o aval do Poder Legislativo, em transformar os serviços de água e esgoto sanitário em um negócio. Neste negócio, já na sua preparação há dúvidas e incertezas, para não dizer desconfianças. O negócio pode estar legal, no entanto, pode estar cercado de uma imoralidade e de benefícios pessoais. Foi assim, em quase todos os locais onde os serviços de água e esgoto foram privatizados. Em Cochabamba/Bolívia não só privatizaram os serviços, mas sim, proibiram a coleta de água de chuva pelos campesinos. Em Grenoble/França o processo corrompeu altas autoridades governamentais. Em Limeira/SP e Niterói/RJ houve questionamentos jurídicos da licitude dos procedimentos. E quem paga? A população! Quem ganha? O mercador de ilusão! Se por anos o município através dos seus governantes não soube fiscalizar estes serviços, saberá regulá-los? O criador (quem faz o plano de saneamento do município e os estudos de viabilidade do negócio), tem por característica moldar as agências de regulação de tal forma que o regulado, regula o regulador. Ou seja, sempre haverá um recurso administrativo ou judicial.
Vamos analisar a notícia de outro lado, pelo lado financeiro. Investir 273 milhões em 30 anos, representam 9,1 milhões/ano, que divididos por 34.000 economias (jan/2010), resultariam em R$ 22,30 por economia, ou seja, R$ 5,58/pessoa.mês. Este valor, por si só, não seria um absurdo. Há que se por em dúvida o valor, pois se utilizássemos um referencial mundial de R$500,00/pessoa, para um atendimento de 80% nos serviços de esgoto, seriam necessários (R$ 500,00/pessoa x 34000 economias x 4 pessoas/economia x 0,80 = R$ 54.000.000,00), R$ 54.000.000,00. E para resolver o problema da falta de água? A pergunta que se faz é porque os projetos de transposição de água o Rio do Cravo não foram realizados? Porque não foram encaminhados para serem financiados com recursos não onerosos da União? Faltou competênia, coragem, ou o que se pretende fazer é mesmo um negócio utilizando-se do conceito não claro do equilíbrio econômico-finaneiro e os recursos dos cidadãos desta cidade que não merecem atitudes autoritárias e pagarem o ônus de uma decisão política equivocada. Quem diz que R$ 273 milhões é o valor correto. A pergunta que cabe é, investir em que: quais obras, tecnologias, com que taxa de retorno, com ou sem ISSQN, com ou sem pedágio? Parece que uma avaliação de benefício/custo ou sobre a tecnologia, ou sobre o empreender esforços para buscar verbas do Orçamento Geral da União (OGU) não onerosas, para minimizar os impactos financeiros da necessária infra-estrutura de saneamento sobre a população de Erechim, não tem importância nenhuma. A inteligência que julgamos necessária no âmbito municipal para elaborar seus planos, seus projetos ou participar da sua discussão, de fiscalizar e bem gerenciar as cidades, dará lugar para um negócio a ser firmado, como se fosse um cheque em branco?
Algo não pode estar certo nesta história recente de Erechim, não sei o que é. Há um ditado no qual se diz que “a cegueira mental leva à escuridão, bloqueia a criatividade e se rende ao que nos dizem que é bom”. Se há uma estimativa de lucro de R$ 12 milhões ano, porque repassar esta oportunidade de ganho para as contas dos usuários dos serviços (população de Erechim)? Por que não repassar esta produtividade para reduzir tarifas? Ou porque não utilizar parte destas disponibilidades para a área dos resíduos sólidos e/ou drenagem? Pesquisas realizadas em vários municípios do Rio Grande do Sul têm apontado que a população deseja bons serviços de saneamento, sem elevação de tarifas. E isto, com controle social, com boa gestão, o setor público é capaz. Exemplos, não faltam (Penápolis/SP, e tantos outros prestadores dos serviços associados à ASSEMAE).
O discurso para a viabilidade do negócio ou PPPs no saneamento é sempre o mesmo, vai da incapacidade administrativa até a impossibilidade para financiar esta atividade vital. Joga-se à opinião pública um número elevado.
“Água e saneamento de Erechim podem ser privatizados"
17/08/2010 - 16:18 — aline
(1'56'' / 456 Kb) - A cidade de Erechim no Rio Grande do Sul pode ser a primeira do estado a privatizar o serviço de distribuição de água e saneamento básico. A Prefeitura abriu um edital de licitação convocando empresas privadas a concorrerem pela exploração do serviço. Pelas regras, o consórcio ficará responsável pelo investimento de R$ 273 milhões no setor, e o custo será repassado para a conta do consumidor.
O consórcio com a empresa vencedora valerá pelos próximos 30 anos. Sindicatos, pastorais e movimentos sociais estão mobilizados contra a privatização do serviço. O integrante do Fórum Popular em Defesa da Água, Gilberto Cervinski, conta mais detalhes.
“Eles estão dizendo que a Prefeitura não tem condições de fazer o investimento e então que repassaria para a iniciativa privada a responsabilidade para resolver o problema de saneamento [no município]. Na verdade as empresas privadas não irão investir nenhum centavo, porque é a população que vai pagar o investimento.”
Segundo Gilberto, a Odebrecht – por meio da filial Foz do Brasil – e a francesa Suez estão interessadas em participar da licitação.
“O faturamento com a água em Erechim geram em torno de R4 20 milhões por ano. Nos estudos de viabilidade econômica [feita pela empresa Ampla Consultoria e Planejamento] foi detectado que o faturamento pode chegar a R$ 45 milhões por ano e pode gerar um lucro líquido de cerca de 12 milhões anuais. Pra uma grande empresa é um ótimo negócio.”
O edital também prevê a criação de uma agência reguladora no município, que será mantida através de 2% do faturamento total da distribuidora. O reajuste no valor anual das contas, entretanto, não será feito pela agência reguladora, mas pela própria empresa distribuidora.
O fechamento do edital está previsto para o dia 03 de setembro. Até lá, o Fórum Popular em Defesa da Água espera mobilizar a população de Erechim para barrar o projeto.
De São Paulo, da Radioagência NP, Aline Scarso.”
Em outra notícia,
"Em Erechim (RS), população luta contra privatização da água"
18/08/2010 - Karol Assunção *- Jornalista da Adital
A água no município de Erechim, localizado no norte do Rio Grande do Sul, corre o risco de ser privatizada. Para chamar atenção da população para o assunto, organizações e movimentos populares da cidade formaram o "Fórum Popular em Defesa da Água de Erechim". A preocupação é que a água da localidade se transforme em negócio de grandes empresas.
De acordo com comunicado divulgado pelo Fórum, no ano passado, a prefeitura de Erechim contratou a empresa Ampla Consultoria e Planejamento, ligada à Associação Brasileira de Concessionárias Privadas de Água e Esgoto (ABCON) e à transnacional Odebrecht, para realizar um estudo na cidade. Na ocasião, a empresa sugeriu regras semelhantes às utilizadas na tarifa de energia elétrica que, para as organizações integrantes do Fórum, são regras usadas para "transformar a água em mercadoria".
Neste ano, vereadores do município aprovaram uma lei que seguiu as ações do "Plano da Ampla" e a Prefeitura, por sua vez, pretende abrir edital para licitação e concessão para prestação de serviços públicos de abastecimento de água e esgotamento sanitário. Segundo Gilberto Cervinski, integrante do Fórum, a minuta do edital estava aberta para consulta pública até a última segunda-feira (16). O próximo passo será o lançamento do documento.
Cervinski explica que a Prefeitura tem três possibilidades em relação ao serviço de água e esgoto: o da concessão de 30 anos para empresas privadas; a renovação do contrato com a estatal do Rio Grande do Sul; e a municipalização do serviço. "Dos três caminhos, a Prefeitura propôs o da privatização", revela, considerando que a intenção é "tirar a responsabilidade dela [Prefeitura] e passar a conta para que a população pague".
Na opinião dele, o serviço de água e esgoto nas mãos de empresas públicas irá prejudicar a população. "As regras propostas vai penalizar o povo. Tudo vai cair para a população. As tarifas vão aumentar, assim como aconteceu com a energia e com a telefonia", recorda.
Apesar de ser uma questão local, Cervinski faz um alerta para toda a sociedade brasileira. "O assunto é de importância nacional porque, com a crise, as grandes empresas começaram a querer se apropriar da água para transformá-la em um grande negócio", avisa.
Por conta disso, o Fórum Popular em Defesa da Água de Erechim promove uma série de atividades para chamar atenção da sociedade sobre o perigo da privatização da água. De acordo com Cervinski, no próximo dia 3 de setembro haverá uma audiência pública com a Prefeitura da cidade para tentar mudar a proposta de privatizar o serviço. Enquanto isso, o Fórum realiza ações de conscientização nas ruas de Erechim. "Estamos fazendo trabalhos em diversos bairros e comunidades", afirma.
Além disso, as organizações estão com uma campanha pedindo que a população envie cartas às autoridades demandando o fim do processo de privatização. O modelo da carta, assim como endereços dos correios eletrônicos, para envio da mensagem está disponível em: http://www.mabnacional.org.br/materiais/carta_agua_erechim.pdf
Mais informações em: www.mabnacional.org.br”
A partir destas informações acima, tenho uma recomendação. Organizem a população, as entidades de base, as igrejas, a imprensa, pois como aprendi com um amigo que participou da Guerra da Água na Bolívia, de que “o povo unido jamais será vencido”. Haveremos de construir argumentos técnicos, políticos, sociais e ambientais suficientemente fortes e honestos, para mostrar que nossas idéias e argumentos não são absurdos. Enfim, a água, que é o princípio da vida, quando é boa, é transparente, não escolhe credo, classe social, cor ou partido político e quando é ruim, é suja, traz a doença, a miséria e se torna instrumento de poder de poucos em detrimentos de muitos. Por isso vou escrever uma carta ao Prefeito para dizer, não à privatização. Sim à gestão pública através da organização destes serviços no âmbito do município ou através de um contrato de programa com a CORSAN, onde as diretrizes e exigências a serem colocadas deverão ser prioritariamente aquelas que o município julgar importante, não no interesse político, mas no interesse da população.

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